Como fazer o trabalhador se lembrar das regras de segurança no trabalho
Como fazer o trabalhador se lembrar das regras de segurança no trabalho? Porque isso parece ser tão difícil?
O excesso de regras e burocracia é um enorme entrave na efetividade das ações de SST. Com frequência encontramos regras que não adicionam segurança do trabalho ao processo produtivo, mas que mesmo assim estão lá.
Há empresas que acreditam que as regras uma vez informadas ao trabalhador às protegerão na justiça em casos de acidentes de trabalho grave. Mas na verdade, a única proteção jurídica real é não ter acidentes graves! Papel não protege ninguém.
Certa vez numa sala de treinamento, os trabalhadores de uma empresa me disseram que gastam mais de 70% do tempo de trabalho apenas preenchendo papéis para cumprir a burocracia de segurança. Me disseram tem mais medo de esquecer de preencher um papel de segurança do que de esquecer de usar o EPI. Já que não preencher o papel gera punição, mas a falta de EPI não, uma vez que trabalham sozinhos, e assim, em campo, são fiscais de si mesmos… Já imaginou algo assim? Gastar 70% do tempo de trabalho apenas gerando conformidade? Já imaginou o enorme prejuízo para o processo produtivo com todo esse enorme tempo gasto?
O alto volume de regras dificulta que as pessoas se lembrem delas e, sendo assim, não garantem a segurança.
Já parou para pensar em quantas regras se aplicam a um enfermeiro típico de enfermaria de um hospital?
Jeffrey Braithwaite, pesquisador da Universidade de Macquarie e seus colegas encontraram cerca de 600 regras que regem cada pequeno espaço no seu trabalho. Há regras para lavar as mãos, separar medicamentos, descartar pérfurocortantes, não bloquear os equipamentos anti-incêndio, modo de utilização da sala de descanso, etc. Mas quantas dessas regras os enfermeiros realmente conheciam? Quanto você acha, qual o seu chute?
Em média os enfermeiros conseguiam se lembrar de cabeça de apenas 3 regras! O restante era considerado como se fosse irrelevante na sua atividade cotidiana, ou já estava naturalmente incorporada nas suas rotinas de trabalho.
Curiosamente, mesmo se lembrando de tão poucas regras, o trabalho é realizado com segurança já que os pacientes não se machucam ao receber seus cuidados. E nas nossas empresas, será que o cenário é diferente? Faça uma análise sincera disso.
A burocracia não é um problema que afeta apenas os brasileiros. Em 1996 apenas 5,9% da força de trabalho australiana eram da área de compliance, já em 2014 a proporção já era de 9,6%. Um em cada onze australianos se ocupam apenas de observar o trabalho dos outros.
AS NORMAS SOCIAIS
Muitas vezes as regras escritas se chocam contra as regras informais. As normas informais, também conhecidas como normas sociais, são aquelas normas que não estão escritas, mas que são as que valem no final das contas.
Os procedimentos são legalmente considerados uma extensão da autoridade formal de uma organização, mas são frequentemente ignorados e desconsiderados pelas normas informais dessa mesma organização (Schulman, 2013, p 243).
As normas sociais são fortalecidas a partir dos comportamentos dos trabalhadores que a própria liderança espera, reconhece e valoriza.
Por mais que as regras escritas apontem na direção contrária, é preciso entender que as normais sociais sempre vencem as normas escritas, a cultura sempre vence o papel! Se você tem uma regra escrita dizendo para o trabalhador “não faça manutenção com a máquina ligada”, mas se na prática a liderança endossa por ação ou omissão que seja feita com a máquina ligada, ela tenderá a ser feita com a máquina ligada!
Mas o que podemos fazer para remar contra essa maré? Se todas essas regras não garantem a segurança, o que fazer então?
COMO FAZER O TRABALHADOR SE LEMBRAR DAS REGRAS DE SEGURANÇA?
O volume de regras deve ser mínimo: As regras devem existir para assegurar mais segurança ao processo produtivo, e não para defender o empregador em caso de acidente grave e reclamação na justiça. Até porque a única forma de proteção jurídica nesses casos é não ter acidentes graves.
Diminuir as regras de SST não é uma galáxia inexplorada. Outras empresas já fizeram isso, como a rede de supermercados australiana Woolworths, algo relatado no livro O Anarquista da Segurança: Apoiando-se na Perícia e Inovações Humanas, Reduzindo a Burocracia e Compliance. Autor Sidney Dekker. Eles fizeram o caminho reverso do que a maioria das empresas fazem, e colheram mais engajamento nas pautas de SST e diminuição nos acidentes de trabalho.
Envolva os executores na criação das regras: Há muitas empresas que criam regras que só funcionam no papel (até porque papel aceita tudo), mas que no dia a dia, na prática o próprio processo produtivo a força a ser letra morta.
Quando o executor participa da criação das regras a chance de encontrar o encaixe quase perfeito aumenta muito, digo “quase” porque como o processo produtivo nas grandes e médias empresas é complexo, cheio de microetapas, acaba sendo complicado encontrar algo que possa que se encaixar em empresas diferentes com processos diferentes.
Avalie frequentemente, em parceria com os executores se as regras existentes fazem sentido: Os executores são os agentes perfeitos para avaliar se as regras existentes estão sendo utilizadas, e assim sendo, se estão sendo um peso, ou se adicionam segurança ao processo produtivo. A partir da análise pode ser tomadas decisões de manter, retirar ou modificar as regras.
Divulgue as regras naturalmente: As poucas regras que sobreviverem aos filtros mencionados acima já estarão divulgadas aos trabalhadores já que eles ajudaram a criá-las!
Como diz o Scott Geller “as pessoas só apoiam aquilo que elas ajudam a criar”. As regras criadas com a participação dos trabalhadores farão com que eles se sintam os donos delas, e assim, serão os principais defensores e divulgadores delas.
Programa de Comportamento Seguro.
Palestra Percepção de Riscos – Para SIPAT.